segunda-feira, 18 de novembro de 2013

O Cantinflas do rock ligeiro

Entrámos no Buddha Bar de Milfontes durante a pausa do músico que lá ia tocar pela primeira vez, no sábado à noite. Queríamos, e até poderíamos ter chegado a tempo - era o combinado -, mas tivemos de nos demorar na Tasca do Celso porque a mulher do dono nos ofereceu licor de bolota e um cestinho com nozes, amêndoas e figos. O Duarte Gomes também lá estava a jantar. Encheu a boca de sei lá o quê e bebeu cola zero, na companhia de uma garota com dentes de vinho, e em menos de nada se pôs a andar. Gosto de pensar que se desfez em - pronto, nisso mesmo. Ela que seja feliz.

O músico do Buddha Bar de Milfontes trazia uma camisa pálida enfiada numas calças de ganga muito grandes e via por óculos; tinha uma voz grave e desolada; era pequeno como um pinipom.

Recomeçou nas cantigas com a ‘I’m on fire’ do Bruce Springsteen e daí passou para a ‘This is the Life’, da Amy Macdonald. Ocorreu-me pensar nele como o Cantinflas do rock ligeiro. Numa das mesas, tal como na véspera, estava um rapaz que não deve fazer a barba há 15 anos e a namorada, que lembrava a Juliette Binoche e dizia nunca ter acordado ressacada na vida, apesar de lhe dar bem na cerveja. Jogavam ao dominó.

O rapaz da barba até ao umbigo passou a segunda parte do concerto do Cantinflas do rock ligeiro a pedir ‘Ring of Fire’ do Johny Cash, mas não teve sorte porque o músico não tinha nada disso no repertório dele. Não satisfeito, esperou que o Cantinflas abandonasse a guitarra e, quando isso aconteceu, precipitou-se para o palco e atirou-se à ‘Ring of Fire’ alegando estar farto de ver a namorada dar-lhe na tromba no dominó.

Tocava e cantava “(…) The taste of love is sweet (...)’ como se fizesse vida daquilo, e pelos vistos faz. É guitarrista numa banda de destruição maciça chamada 10 000 Russos.

Ainda tocou mais alguns temas e depois regressou à mesa para dissertar sobre a influência do Bob Marley na história da música, que dizia ser coisa nenhuma. “O Lee Perry, os gajos que inventaram o dub, isso sim; o Bob Marley não fez nada que já não tivesse sido feito”, argumentava. Quanto à Rosa, dona do bar que por essa altura já se tinha juntado à confusão, contrapunha que o Bob Marley era muito bom porque ela gostava muito dele.

Começámos a falar de cumbia e em poucos segundos já tínhamos assaltado a aparelhagem com Chicha Libre. Dançámos como macaquinhos, bebemos e os clientes fugiram. “Voltem!”, pediu a Rosa na despedida.